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A escrita à mão é muito importante. O único problema é que muitos educadores ensinam a escrever de forma legível apenas nos primeiros anos escolares, depois disso a ênfase passa rapidamente para a habilidade no teclado.
Quando as crianças aprendem a escrever à mão, elas não apenas aprendem a ler em menos tempo, como se mostram mais capazes de gerar ideias e reter informações. Embora nem todos os especialistas estejam convictos da importância dos benefícios de longo prazo da escrita à mão, Paul Bloom, psicólogo da Universidade Yale, considera "O próprio ato de escrever algo à mão obriga você a focar sobre o que é importante".
A equipe do JATV realizou entrevistas com duas professoras para conhecer, através da visão e do conhecimento delas em sala de aula, o posicionamento e a forma de expressão predominante entre os alunos nos dias atuais. É um feedback importante dentro deste enfoco, visto que a sociedade vive um período acelerado pelas teclas dos computadores e celulares e longe de lápis, caneta e papel. Afinal, é relevante manter a prática da escrita à mão?
Confira relatos e opiniões dessas duas profissionais em educação. Uma delas, Katia Regina Zickuhr Ignaczuk, é especialmente ligada às formas da escrita, da linguagem e comunicação, é Pós-graduada em Língua Portuguesa e Literatura. A outra, Edina Maria Burdzinski, é Professora e Estudante de Mestrado na área de Sociologia, que estuda a vida social humana. Sociologia é o campo do conhecimento que investiga as relações sociais entre diferentes grupos humanos, seus conflitos e conexões.
Katia Regina Zickuhr Ignaczuk, Professora, Pedagoga e Pós-graduada em Língua Portuguesa e Literatura. Tem 36 anos e é professora há 18 anos, porém leciona na área de Língua Portuguesa e Literatura há 4 anos. Atua na EEB Dr. Fernando Ferreira de Mello, em Rio do Campo, cidade onde reside.
JATV: Você professora, acredita que hoje quase não é mais utilizado a escrita à mão?
Professora Katia: Estamos vivendo um momento bem delicado onde a tecnologia tomou conta de tudo. A escrita está sendo deixada de lado, e mais, o que ainda se escreve é tudo abreviado. Contudo, a tecnologia se bem utilizada é muito importante.
JATV: O que é mais comum hoje, trabalhos manuais ou digitados (impressos)?
Professora Katia: Como sou professora de Língua Portuguesa eu não aceito trabalhos digitados, sempre peço que meus alunos escrevam à mão, desta forma incentivo eles a escreverem corretamente e a exercitarem a caligrafia.
JATV: No tempo em que você era aluno, os trabalhos eram praticamente manuais, até mesmo porque a tecnologia digital estava disponível para poucos. Você acredita que ao escrever o aluno aprende mais? Por quê?
Professora Katia: Com certeza, quando estudava escrevíamos muito e se hoje tenho uma letra legível e consigo escrever corretamente foi porque os professores que me alfabetizaram estimularam muito a leitura e a escrita, inclusive naquela época utilizávamos o tal caderno de caligrafia, que hoje pouco é utilizado. Se você escreve, você consegue assimilar com mais facilidade a palavra e quando for reescrevê-la irá lembrar da escrita da mesma.
JATV: E como está a escrita dos alunos? Tem aqueles alunos que abreviam as palavras, como usam nos meios digitais?
Professora Katia: Como mencionei anteriormente a tecnologia está muito avançada, existem recursos como os corretores digitais e isso tem prejudicado muito os alunos, pois ao escreverem seus textos o mesmo é corrigido por estes corretores. Ao escreverem na escola percebe-se que há muitos erros na escrita (ortografia) e também não há concordância entre as palavras, faltando assim a coerência e coesão. Nosso trabalho é muito árduo, pois precisamos incutir nos alunos o gosto pela escrita correta e coesa. O que podemos perceber é que nossos alunos pouco leem e isto faz com que seu vocabulário fique empobrecido.
JATV: As redações são feitas com frequência em sala de aula?
Professora Katia: Nas minhas aulas sim. Procuro fazer sempre redações em todos os bimestres. Não somente redações, mas também contação de histórias, reescritas e textos diversos. Para cada série solicito variados tipos de gêneros textuais.
Uma proposta muito importante e legal é a Olimpíada de Língua Portuguesa que é realizada sempre de dois em dois anos, onde os alunos de todas as séries têm a possibilidade de escrever vários gêneros textuais, como por exemplo: poemas (6º ano), memórias literárias (7 º e 8º anos) crônicas (9º e 1ºanos) artigo de opinião (2º e 3º anos, do Ensino Médio). A escrita destes gêneros textuais tem estimulado muito os alunos, alguns escrevem porque realmente gostam e outros porque são obrigados.
Vejo nestes quatro anos que leciono LPL (Língua Portuguesa e Literatura) que muitos de nossos alunos tem por hábito a prática cotidiana da leitura e sem dúvidas é um dos fatores que influenciam muito na escrita. Outro fator muito relevante é a própria redação do ENEM, nós sabemos que ela é muito importante neste exame, então procuramos incentivar muito os alunos a lerem para consequentemente poderem escrever textos coesos e coerentes nesta redação.
JATV: Para você, qual a importância da escrita manual?
Professora Katia: A escrita à mão é de suma importância. Primeiro porque ela sempre foi parte essencial da cultura e da formação do indivíduo e segundo que escrever à mão envolve vários sentidos, além de ativar uma ligação direta com o cérebro, que recebe um feedback das ações motoras, juntamente com a sensação do toque do lápis e do papel, para depois nossa visão reconhecer a letra caligrafada. Segundo especialistas, a escrita à mão também desenvolve músculos, articulações e que a caligrafia individual pode revelar distúrbios nervosos em estágio inicial. Inclusive, é possível distinguir cada um dos alunos pela sua caligrafia e até perceber a personalidade de cada um, tal como sua concentração e estado emocional.
Enfim, poderia escrever inúmeros benefícios que a escrita à mão pode nos proporcionar, assim como escrever e expressar suas ideias com mais facilidade e clareza, além de que a memória e a criatividade do aluno tem uma relação intrínseca com o movimento da escrita.
Essa prática é um desafio para os professores em sala de aula, pois a maioria dos nossos alunos não gostam de escrever, por isso nós precisamos desde muito cedo estimular as crianças a terem o hábito da escrita, deixar de lado as folhas mimeografadas, digitadas e voltar a utilizar o "famoso quadro negro", somente assim estaremos incentivando os alunos a escreverem de forma coesa e coerente.
Edina Maria Burdzinski, Professora e Estudante de Mestrado. Tem 36 anos e atua há 12 no Magistério, sempre na EEB Padre João Kominek, em Santa Terezinha, onde também reside. É Professora de Sociologia.
JATV: Você professora, acredita que hoje quase não é mais utilizado a escrita à mão?
Edina: Na verdade, este é um debate que exige uma análise mais profunda, pois quando nos referimos às tecnologias e à virtualidade, quase a totalidade de nossos estudantes tem acesso ao digital por meio de celulares. Mas quando nos voltamos para dentro de nossas salas de aula a maioria dos trabalhos escolares ainda é escrito à mão. E isto se deve, basicamente a dois fatores, o primeiro diz respeito a estrutura física e material que os próprios estudantes possuem em suas casas, assim como a estrutura que a escola oferece.
Ter um celular, um notebook ou tablet, não é assim tão difícil ao estudante, no entanto, dispor de impressora e estrutura instalada para afirmar que nossos estudantes estão gradativamente abandonando a escrita à mão e passando para o papel impresso, já é bem diferente. Muitas vezes, a única possibilidade que o estudante tem de realizar um trabalho impresso está no laboratório de informática da escola, e mesmo assim isto exige um laboratório sempre equipado e funcionando e um pequeno custo de impressão para o aluno.
O segundo fator relaciona-se às práticas dentro da sala de aula, pois os professores sabem desta dificuldade de estrutura dos seus estudantes. Assim como procuram manter a importância da escrita à mão para o processo de aprendizagem, atentos e conscientes dessas dificuldades. Portanto, a escrita à mão ainda é sim, muito utilizada em sala de aula.
JATV: O que é mais comum hoje, trabalhos manuais ou digitados (impressos)?
Edina: Certamente, os trabalhos manuais ainda são mais comuns em nossas salas de aula.
JATV: No tempo em que você era aluno, os trabalhos eram praticamente manuais, até mesmo porque a tecnologia digital estava disponível para poucos. Você acredita que ao escrever o aluno aprende mais? Por quê?
Edina: A ciência já nos mostra alguns estudos apontando que nosso cérebro teria mais capacidade de memorizar dados e informações quando manualmente escrevemos com caneta e papel do que quando digitamos. Particularmente concordo com estes estudos, pois quando leio, assisto uma aula, ou preciso escrever um texto, prefiro recorrer a uma caneta e papel para elaborar meus argumentos e anotar informações importantes. Mas talvez não seja possível e nem sensato afirmar que o aluno aprende mais escrevendo manualmente, pois não podemos afirmar que se a escrita à mão for gradativamente deixada para trás, estará ficando para trás também o conhecimento. Assim como também, não podemos ter garantia que um acesso maior aos meios digitais trará maior apropriação dos saberes do mundo por nossos estudantes.
O que é certo afirmar, é que aprender não é uma atividade que depende mais ou menos de algum tipo específico de fator. Aprender na minha opinião, exige um conjunto articulado de fatores que instigue no estudante a vontade de aprender, de ser curioso e de procurar demonstrar aquilo que aprendeu, também por meio da escrita, seja ela à mão ou impressa.
Esta discussão sobre o uso das tecnologias e a educação é muito complexa, talvez a pergunta a ser feita seja: qual o uso que fazemos das tecnologias e dos meios digitais na educação? Porque não podemos confundir acesso à informação com conhecimento e aprendizagem. Aprender é um processo que exige disciplinamento e persistência, paciência, vontade e determinação e definitivamente, não é algo agradável nem muito prazeroso, é preciso admitir isto. Logo, seja em frente a um papel em branco ou a uma tela em branco, escrever exige que se tenha em mente argumentos que são pré-concebidos a partir das informações que acumulamos e da teia de teorias e ideias que vamos mentalmente formulando e que, como que montando um quebra-cabeça, vamos exteriorizando e dando forma, seja com papel e caneta, seja com tela e dígitos.
Disto tudo, uma coisa é certa, este acúmulo gradativo de informações que nos permitem exprimir nossas ideias, depende inevitavelmente de um outro fator, a leitura.
Certamente, o que faz um estudante aprender mais é atenção, leitura e concentração. E isto independe do método que se esteja utilizando, tanto faz se tela ou papel. Talvez o que se deva fazer é dialogar com professores, gestores, pais e estudantes que não podemos confundir acesso às tecnologias com garantia de conhecimento e que, quem sabe um dia, chegaremos ao consenso que o que importa para se aprender mais e viver melhor e tornar o mundo melhor de se viver, é dar condições ao estudante para que ele compreenda que estudar é importante para a vida e mediar os caminhos de nossas crianças e jovens para que queiram aprender, e que tenham liberdade de escolher a melhor forma de mostrarem, de exibirem para o mundo aquele conhecimento que conquistaram, seja escrito à mão, seja impresso e digital.
JATV: E como está a escrita dos alunos? Tem aqueles alunos que abreviam as palavras, como usam nos meios digitais?
Edina: A escrita dos estudantes na sala de aula, não costuma refletir muito as abreviações e linguagens virtuais, pois a escola ainda é o espaço em que são cobrados a formalidade e padrão atribuídos à escrita ortográfica. A maior dificuldade ainda continua sendo fazer com que o estudante escreva corretamente as palavras e consiga se expressar utilizando um arcabouço de conceitos e argumentos exteriorizados corretamente por meio das palavras e textos.
JATV: As redações são feitas com frequência em sala de aula?
Edina: Nas minhas aulas de Sociologia, meus estudantes podem confirmar que as redações eram minha principal ferramenta. Mais do que perceber o quanto o estudante se apropriou do conteúdo aplicado, é na redação que percebemos claramente a facilidade ou a fragilidade que o estudante tem de se expressar, de se posicionar, de defender suas ideias, ou de expor suas razões. Através da redação costumamos nos "espantar" com argumentos que muitos estudantes tem dificuldade de expressar oralmente, mas que uma vez, através da escrita, libertam-se para dissertar aquilo que pensam ou que tem vontade de dizer.
Defendo que as redações deixem de ser apenas atribuição das aulas de português, e que professores e estudantes compreendam que escrever exige saber mais, e que saber mais, é tudo aquilo que a sociedade precisa para vivermos melhor.
JATV: Para você qual a importância da escrita manual?
Edina: Escrever é se posicionar. Este é um dos pontos chave. Se deparar com uma folha em branco e uma caneta exige coragem para publicar aquilo que você pensa, defende ou ofende, gosta ou critica, foge ou enfrenta, estuda ou releva, nega ou admite, sobre qualquer assunto. O que temos a impressão nos dias de hoje, é que os meios digitais, principalmente através das redes sociais de entretenimento e comunicação, tornam mais fácil ou menos pretensiosa esta tarefa, pois ficamos atrás de uma tela. Não há nem uma troca física de olhar e nem um papel material para ser usado depois como "prova" de nosso posicionamento, daquilo que defendemos e assumimos. E o que vemos é um festival de comentários e publicações racistas, homofóbicas, ofensivas, que incitam a violência gratuita e principalmente a intolerância com o outro ser humano.
Talvez a importância da escrita manual, e principalmente quando a aplicamos com nossos estudantes, em sala de aula, seja a de ensinar a eles que escrever é muito sério e importante, e é extremamente necessário que eles se deparem com uma folha, um papel em branco nesta fase tão importante de crescimento e de apropriação das coisas do mundo.
Escrever manualmente exige uma imersão no mundo interior de cada um, na consciente racionalidade que todos nós seres humanos possuímos. Sem copiar, sem colar, sem tela, sem pesquisa e sem google, e principalmente, sem deletar depois ou desfazer a amizade, nos deparamos com nós mesmos e com aquilo que pensamos e já conseguimos construir de conhecimento do nosso eu com os outros "eus" do mundo. E é imensa a responsabilidade que temos ao ensinar nossas crianças e jovens a construir, com relação aos limites que essa relação do individual e do coletivo exige.
E que a importância da escrita manual se encontra neste exercício que precisa ser urgentemente feito entre o posicionamento que adotamos e a responsabilidade de exteriorizar aquilo que defendemos em nome de uma convivência, de fato, humana.
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