Quase que semanalmente, devido ao trabalho que Claudio Kotelak realiza na escola da localidade, como diretor, e pelas atividades que Claudio e sua esposa, Valceni, sempre desempenham, como catequistas, junto à igreja Sagrada Família, da comunidade de Rio da Prata, o Pároco, Padre Jonas Malek, costuma visitar a família.

O dia 03 de novembro foi um dia muito incomum que certamente deixará marcas na memória de Claudio, o chefe da família, de Valceni, a mãe e esposa zelosa, de seus filhos, Gustavo e Paulo, e do querido companheiro, mestre e amigo da família, Pe. Jonas.

Na quarta-feira (09), a equipe do Jornal A Tribuna do Vale esteve na localidade de Rio da Prata, em Rio do Campo, na casa que foi invadida pelos bandidos que assaltaram o Banco do Brasil, num dos momentos em que os mesmos buscavam fugir da região.   

Em entrevista, Padre Jonas comentou que era ciente do assalto que havia ocorrido no banco, porém acreditava que os bandidos estivessem distantes da região "Logo cedo fiquei sabendo, mas eu acreditava que eles estavam bem longes do local, até porque já havia passado um dia inteiro", comenta.

Já Cláudio chegou a alertar a esposa, que leciona durante o dia em Santa Terezinha, para ter cuidado "Eu tinha ciência que eles estavam por aqui. Inclusive minha esposa foi trabalhar de manhã, em Santa Terezinha, e eu disse para ela ter cuidado, pois eles estavam por aqui. Mas depois fomos para casa e nunca imaginei que isso aconteceria conosco", cita.

A ação dos meliantes aterrorizou a família e o padre

Padre Jonas relata que ele e o casal estavam dialogando no ambiente da cozinha, que fica a parte, atrás da residência principal da família, quando os bandidos entraram no ambiente "Estávamos conversando quando escutei Valceni gritando 'ai meu Deus' e os caras entrando".

Valceni recorda com detalhes o momento da abordagem "Eu levantei para ir no forno, pois eu estava assando uma torta, de repente vi um vulto preto entrando com aquelas armas e só gritei 'ai meu Deus'. Daí ninguém mais falou nada, eles entraram e disseram para que ninguém reagisse, que ficássemos quietos e calmos porque eles só queriam fugir. Estavam assustados e queriam fugir".

A angústia maior para o casal e o padre foi porque os filhos não estavam junto deles, estavam em outro cômodo e Valceni relata a aflição e preocupação com os filhos "Foi muito rápido, eles falaram isso e perguntaram: É tudo família? Aí eu disse: É meu marido e tenho meus meninos. Automaticamente eles me responderam: Eles estão lá dentro e lá dentro irão ficar. Então pedi para que deixassem trazer os meninos para junto de nós, mas não fui atendida", relata a mãe.

A presença do Padre Jonas na casa mudou o comportamento dos bandidos

Em meio aos fatos, os bandidos perguntaram ao padre quem ele era, diante da resposta do padre os homens recuaram "Ele se identificou como padre e então o bandido até recuou, deu um passo para trás e abaixou a arma. Aí o Padre interviu e pediu para que trouxessem os meninos para juntos de nós", comenta Valceni. 

Neste momento da abordagem os assaltantes acatam o pedido do padre "O padre, usou estas palavras: Tragam os meninos para ficarem junto com a mãe. Nisso um deles falou: Pode ir lá buscar; e um deles me segurou pelas costas para mim não fugir e me levaram até lá", descreve a mãe.

A dor de Valceni foi ver os seus filhos deitados no chão com uma arma apontada na cabeça "No momento que cheguei lá estavam os dois detidos no chão. O maior acalmando o menor com uma arma na cabeça. Havia dois bandidos com os meninos e três conosco". 

A presença do Padre Jonas na casa mudou o comportamento dos bandidos, afirma Valceni "No momento que ficaram sabendo que ele era o padre, um deles saiu do ambiente que estávamos e foi lá dentro e falou para os outros: Calma, calma, pois aqui tem um padre e a família é do bem; contou-me meu filho após toda ocorrência. Foi nesse momento então que eles tiraram o capuz. Eles pediram comida, foram procurando em armário e geladeira, servimos um lanche para eles. Parece até irônico, eu estava fazendo uma torta, mas eles não quiseram esperar", relata Valceni.

Padre Jonas descreve que os meliantes pediam para eles colaborarem "A primeira coisa que falaram quando entraram foi: Precisamos fugir daqui, estamos com fome e precisamos da ajuda de vocês, e se colaborarem conosco iremos colaborar com vocês, pois não somos assaltantes de casa, somos assaltantes do governo, de banco. Tanto que quando chegaram eu ofereci meu carro para eles levarem e deixarem o da família, e eles disseram: Não, vocês irão ligar para a polícia", descreve o padre.

O medo diante da situação de impotência 

Valceni afirma que sentiu muito medo "Sim, eu tive muito medo ao vê-los entrando. Pensei que seria o fim". Para Cláudio, a sensação foi de impotência "Ficamos realmente sem ação mesmo, o medo tomou conta de nós, foi muito assustador. Fiquei com medo de acontecer algo ruim com a família". Padre Jonas relata que em se tratando de bandidos o pior sempre é possível acontecer "Eu também fiquei com medo, pois eles poderiam simplesmente chegar atirando, pegar os carros e irem embora, são bandidos, é isso o que eles fazem. Eles queriam se livrar do problema deles, independente do que custasse".

A família e o padre disseram que os bandidos ficaram na residência aproximadamente 20 minutos e descrevem quais foram os momentos de mais tensão. Para Claudio foi o primeiro momento e também o momento em que embarcaram no carro para ir com eles. E ainda, ouve tensão pela velocidade que eles andavam e quando passavam por carro de polícia no caminho.

Da residência os bandidos levaram celulares, alguns objetos da casa, joias, um pouco de dinheiro, além do veículo da família que depois foi recuperado. 

O sequestro e a fuga

O principal objetivo dos assaltantes era usar a família para chegar até a BR-470. Cláudio relata que o caminho percorrido foi escolhido para evitar locais onde houvesse a possível presença de viaturas de polícia. Saíram de Rio da Prata, passaram por Varaneira, depois Vitor Meireles, Wittmarsun, Presidente Getúlio e Ibirama, onde acessaram a rodovia federal e foram soltos.

Claudio e Padre Jonas foram levados nos veículos, cada um estava de carona em um carro. Cláudio conta que por três vezes encontraram a polícia fazendo rondas "Em Vitor Meireles, Presidente Getúlio e em Ibirama, onde acredito que foi pior. Foi bem na rotatória, fizemos a rotatória junto com a viatura, mas passamos e a polícia seguiu. Graças a Deus a polícia não fez nada". O Padre Jonas explica que os meliantes queriam ir por Taió, em um primeiro momento, "Falamos para ir por Vitor Meireles por causa da polícia, pois como eles mesmo diziam, eles tinham colete, nós não", comenta.

O medo de um encontro com a polícia existia por uma hipótese de confronto. Valceni conta que foi intimidada antes dos bandidos deixarem a residência "Eles vieram para mim e falaram assim: você só reze para não ter polícia na estrada, pois se tiver polícia não iremos parar e terá tiroteio. Havendo tiroteio, haverá vítimas e não seremos nós; aí eles mostraram o colete para mim", revela a esposa de Cláudio.

Valceni conta que após a fuga dos bandidos em que levaram o Padre e Cláudio, ficou em um quarto com seus filhos "Eles queriam que eu não ligasse para ninguém. Quando eles estavam aqui, até foi dada a ideia de me trancar com os meninos no quarto para não ter dúvida depois que eu liguei. E lá eu fiquei por essas duas horas que eles disseram que depois de duas horas alguém viria me ajudar", explica.

Padre Jonas explica que os próprios assaltantes não sabiam onde estavam "Estavam perdidos e queriam alguém para mostrar o caminho para eles. Tanto que eles quiseram ir por Taió e depois pensaram em ir para Salete também, mas falei para irmos por aqui que era melhor". Os meliantes seguiram o conselho do Padre e optaram pelo caminho sugerido. Pela velocidade em que dirigiam, o Padre declara que os veículos chamaram muita atenção por onde passaram.

Cláudio conta que um amigo seu da Varaneira achou estranho o que viu devido ao horário e trajeto. "Até desconfiaram que algo de ruim estava acontecendo", diz Cláudio.

Padre Jonas relembra alguns momentos no percurso em que os meliantes questionavam se Valceni não ligaria mesmo para a polícia "E que queriam só fugir, não havia comentário entre eles. E perguntaram se havíamos ouvido falar algo sobre o assalto, eu disse que sim e pronto", declara.

Cláudio disse que o motorista lhe perguntou sobre as roças de fumo, o que faziam, entre outros questionamentos da profissão. "Eu respondia por obrigação", comenta.

O veículo de Cláudio saiu de sua casa sinalizando que o tanque de combustível já estava no nível reserva. O Padre diz que foi um milagre o carro ter chegado até lá. A gasolina terminou definitivamente já quando estavam na BR-470 e foi neste momento que ambos foram liberados.

Cláudio conta que no momento em que o meliante, que estava dirigindo, estacionou e avisou que eles iriam embora, teve uma sensação de alívio "Foi igual libertar um passarinho de uma gaiola. Não via a hora de embarcar no carro e achar o rumo de casa", relembra. Jonas disse que nesse momento a sua grande preocupação era saber o que havia acontecido na casa onde ficaram Valceni e seus dois filhos "Não vimos onde botaram eles, não sabíamos de nada. Também queríamos avisar que estava tudo bem conosco", comenta.

Ao liberar Cláudio e Jonas, os assaltantes disseram que os dois poderiam ir embora, mas deram um prazo mínimo de duas horas para esperar até acionar a polícia. Caso essa solicitação não fosse atendida, os bandidos prometeram penalizar a família "Se acionar antes, eles sabiam onde morávamos, isso foi o que eles disseram", disse Cláudio.

Jonas conta que quando os carros pararam não havia medo de que algo ruim fosse feito com eles. Cláudio disse que tinha certeza que eles seriam liberados "Eles disseram que iriam liberar a gente, nós iríamos embora. Eles passaram uma certa confiança", afirma.

A volta para casa e o reencontro com a família

Cláudio destaca uma atitude que os meliantes tiveram, que foi a de devolver parte de seu próprio dinheiro que haviam furtado para que eles pudessem abastecer o veículo e voltar para casa "Eu perguntei ao rapaz se ele não tinha um dinheiro para colocarmos gasolina no carro para poder voltar. Eles nos deram 80 reais, colocamos 70 de gasolina e compramos uma água para tomar, pois estávamos com a boca seca. E quando cheguei em casa eu falei para o meu filho mais velho que os caras ainda tinham sido 'bons', pois deram o dinheiro para a gasolina, aí meu filho disse: Não pai, é o dinheiro do pai mesmo que eles haviam roubado. Mas no final ficamos feliz ainda com isso", explica.

A primeira atitude ao estarem livres foi a de procurar um posto de combustível e um telefone para ligar para alguém da comunidade "Fomos até o posto e lá ligamos para a irmã Eugênia. Expliquei para ela brevemente que havíamos sido sequestrados, que estava tudo bem, e que era para ela ir até a casa ver como estavam", comenta Padre Jonas.

Valceni conta que durante todo aquele tempo estava angustiada com seus filhos até a chegada de Irmã Eugênia "Quando escutamos o carro entrando ficamos bem quietos. Estava tudo escuro, pois eles haviam apagado todas as luzes e fecharam toda a casa. A irmã chegou aqui, começou a chamar e eu não respondi no início, porque não reconheci a voz. No momento que percebi que era ela, eu abri a janela e comecei a gritar, segurei ela pela mão e disse que ela não sairia dali. Foi um momento de alegria, uma sensação de alívio. Aí ela comentou comigo que o padre havia ligado e que estava tudo bem", relembra emocionada.

Enquanto isso, Jonas e Cláudio voltavam para casa. O Padre chega a brincar dizendo que "não chegava nunca". Eram quase 23 horas quando os assaltantes liberaram os dois. "Não podíamos e nem pensamos em ligar para a polícia. Pois nosso objetivo primeiro era voltar e dizer que estava tudo bem conosco. Pois se fossemos na polícia teríamos que ficar um tempo lá. Então tínhamos que voltar para ver como eles estavam e dizer que estávamos bem", diz Jonas.

Valceni conta como foi rever seu esposo e o Padre "Foi uma emoção muito grande ver eles. Pois eu em casa sabia como eu estava. Mas nem imaginava o que poderia estar acontecendo com eles."
Cláudio resume tudo em angústia, tensão e medo "Torcíamos para que desse tudo certo, da melhor forma para família, filhos e o padre. Vemos que perante uma situação dessa não somos nada, pensamos que pode acabar ali, perder tudo. Nunca havíamos passado por uma situação dessa", declara.

O Padre considera que diversos momentos demonstraram a presença de Deus "Tem alguns fatos que aconteceram que pudemos ver a presença de Deus naquele momento. Até de pessoas que tentaram ligar para a polícia e não deu área. Depois o carro que estava quase sem combustível e chegou até lá. Então são pequenos detalhes que percebemos. Foi bom por estar com a família naquele momento, pois talvez teriam levado toda a família, soltado eles por aí. É bem difícil dizer", explica.

Valceni acredita que a presença do Padre na casa, naquele exato instante, foi intermediada por Deus "Acredito que Deus até tenha tocado no coração deles para eles terem sidos maleáveis na negociação porque eles estavam aceitando tudo o que o padre falava. Talvez se estivéssemos sozinhos a coisa seria diferente. E realmente penso que foi uma intervenção de Deus. Foi muito forte", comenta.

Os dois veículos foram recuperados, um entregaram no dia e outro foi achado na segunda, em Blumenau.