O JATV conta agora uma história emocionante que vai levar você para o ano de 2012 e te fazer lembrar de um fato lamentável e triste. Uma tragédia que comoveu a população de Rio do Campo e região.

Era manhã de 19 de janeiro de 2012, por volta das 10 horas, quando o jovem de 16 anos, Francisco Mauri Kotelak, saia com sua bicicleta da propriedade do amigo e vizinho, Tarcísio Kulkamp, e seguia em direção à sua casa, na SC-427 próximo ao centro de Rio do Campo. E, há cerca de 200 metros de sua residência, se chocou com um veículo que transitava na mesma direção e perdeu sua vida.

Relembrar este fato é muito triste, não é mesmo? Mas a partir de agora você vai se emocionar com uma paixão que envolvia o coração do garoto Xiko e que poucos sabiam, apenas os mais chegados. Para isso, no sábado dia 25 de janeiro, a equipe do JATV foi até a residência do Xiko, onde a família, amigos e vizinhos descreveram, emocionados, esta história.



Mauri Antonio Kotelak, pai do Francisco, conta que o filho, por ser jovem, tinha muitas paixões. "Um sonho grande que ele tinha era ter uma gaita e junto com os amigos, especialmente com o companheiro Daniel Janning, poder tocar e cantar", declara o pai. Mauri conta que o filho gostava do estilo de músicas gaúchas. E nos últimos períodos de vida o Baitaca era a seleção inseparável do jovem. E a música 'Do Fundo da Grota', a preferida. Conforme o pai, outro sonho grande do Xiko era conhecer o Baitaca. "Foi muito triste que ele não conseguiu realizar esse sonho".

Na memória da mãe, Luiza Junkes Kotelak, são vivas as lembranças do filho sentado ao lado do fogão à lenha com um celular na mão ouvindo músicas "Na época não eram tão comuns os aparelhos de celular modernos, e o Xiko tinha ganhado há pouco tempo um 'celularzinho' bem simples, e com aquele aparelho ele estava o tempo todo ouvindo música. Lembro-me dele sentado ao lado do fogão à lenha, ouvindo a música 'Do fundo da grota' enquanto eu cozinhava", menciona Luiza.

Mesmo pequeno e com 5 anos de diferença, o irmão mais novo de Xiko, Mateus Eduardo Kotelak, também guarda as melhores lembranças do irmão "Eu o ouvia cantando bastante, era muito apaixonado por música. Recordo-me que ele gravava as músicas no celular para poder ouvir e cantar", conta. Hoje Mateus está com 19 anos.


Daniel, o amigo gaiteiro inseparável

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Daniel Janning, gaiteiro e amigo inseparável do Xico, fala sobre a paixão do amigo. "Xiko adorava o estilo de música gaúcha. Éramos muito amigos desde a infância na escola e, conforme fomos crescendo, aprendi a tocar, então ele vivia pesquisando músicas e mandava pra eu ouvir, na época ainda por MSN. Com isso ele me inspirava para aprender mais e mais para tirar aquelas músicas na gaita, assim eu e ele passávamos muito tempo juntos".

O amigo das serenatas conta que quem lhe apresentou a música do Baitaca 'Do fundo da grota' foi o Xiko. "Quando a música surgiu, ele veio me mostrar entusiasmado. Acredito que ele se identificou muito com a letra pelo fato de falar do jeito chucro de campeiro, pois ele era assim, gostava muito de cavalo e vivia andando pelos matos. A partir do momento que ele me apresentou a música nós vivíamos cantando e tocando 'Do fundo da grota', pois era a música dele", revela Daniel.

"Essa música 'Do fundo da grota' mexe muito conosco. Faz oito anos que o Xiko partiu e por muito tempo depois da morte do filho não conseguíamos mais ouvir essa música, porque a lembrança dele era muito forte através da canção. Já hoje, é como uma oração para nós, nos move e gela nossos corações quando ouvimos", expressam Mauri e Luiza.


Foi ao amigo de infância, Gabriel, que Xiko fez o último pedido


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Entre lágrimas, o amigo de infância e vizinho, Gabriel Moratelli Kulkamp, relata que Xiko lhe fez um pedido dois dias antes de falecer "A minha amizade com o Xiko era muito grande. Nós crescemos juntos e por conta disso eu sabia de muita coisa que ele queria, sabia dos sonhos e das músicas preferidas. E uma coisa que marcou profundamente meu coração foi algo que ele me revelou dois dias antes de falecer. No momento guardei pra mim e de certa forma me arrependi, mas não tinha como eu explicar isso para alguém", diz o jovem e revela "Em uma terça-feira, dia 17 de janeiro de 2012, ele chegou na minha casa por volta das 17h30min da tarde e nós conversamos até cerca de 22 horas. Em meio às conversas, e escutando a música 'Do fundo da grota' ele falou: "Se um dia acontecer de eu partir e vocês estiverem aqui, quero que vocês cantem no meu velório esta música" - e eu guardei pra mim aquelas palavras", revela o amigo.

Gabriel comenta que no momento fingiu não dar importância, mas dois dias depois, nas palavras do amigo era só o que conseguia pensar. "No dia do acidente cheguei em casa, fui tomar banho e chorava muito, mas não conseguia falar sobre o desejo dele para alguém, porque na minha cabeça o que ele tinha falado dois dias antes iria demorar muito para acontecer. Via as imagens dele no caixão, e mesmo assim continuava sem coragem de contar", relata. Certamente Gabriel não acreditava que o amigo tinha partido.

Mesmo após oito anos do acidente fatal que tirou a vida de Xiko, Gabriel se emociona muito ao lembrar do fato "Passou-se dois dias, menos de 48 horas da minha conversa com ele, era manhã de quinta-feira (19 de janeiro), eu sentado em cima do trator esperando meu irmão, Marcelo, buscar alguns objetos, o Xiko passou por mim contente, sorridente e nos cumprimentamos e ali foi nossa despedida, em menos de 15 metros de onde eu estava ele sofreu o acidente. Contudo, consegui ainda realizar o pedido dele no dia do velório, conversando com a família e amigos, cantamos a música na despedida ao som da gaita do Daniel", diz.


Será que Xiko estava prevendo sua partida?

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Foi para o pai, Tarcísio Kulkamp, que Gabriel revelou o desejo do amigo. "Estava muito chocado com a morte do Xiko e quando Gabriel falou comigo, tremi; e pensei: será que ele previa? E, sim, foi com este entendimento que fiquei, que Deus o queria para estar com Ele", descreve Tarcísio e acrescenta "Naquele momento pedi autorização para a família, que estava muitíssimo abalada. Eles autorizaram dizendo: "Se é o desejo do nosso filho, vamos fazer". Assim cantamos a música. Amigos de infância, amigos de escola e vizinhos acompanharam a letra. Lembro-me que a música não era muito conhecida na região, foi o próprio Xiko que a apresentou para nós, então imprimimos a letra para cada um poder cantar ao som da gaita e violão".

Outra alegria de Francisco era acampar e estar em meio à natureza e a propriedade do vizinho e agricultor Tarcísio era um dos cenários preferidos do jovem "A melodia da música já conhecíamos bem, porque onde o Xiko estava, tinha cantoria dela. Ele estava com frequência na minha casa e faziam acampamentos na nossa propriedade, Xiko, com meus filhos, Gabriel e Marcelo, e amigos como o Daniel, o gaiteiro dos encontros".

"E naquele momento tão difícil, que mexeu com todos, nós revivemos os encontros, os acampamentos do Xiko com os amigos, cantando a música 'Do fundo da grota'. Foi emocionante! Foi bom! Quando terminei de cantar, fiquei com a alma mais leve, foi como um bálsamo. Foi um momento que marcou para todos que estavam no velório", revela Tarcísio.

Para a mãe do Xiko, o desejo do filho de ser homenageado em seu próprio velório com a música 'Do fundo da grota' foi uma surpresa "A gente não sabia que ele tinha revelado para o amigo que tinha esse desejo", diz Luiza.

Com sua gaita, Daniel é acostumado a tocar a música do Baitaca em momentos de alegria. E tocar no velório do amigo não foi fácil, afirma ele. "É uma música de fandango, uma música de festa, mas, assim como para os pais do Xiko que a consideram uma oração, eu a considero um hino. Em qualquer momento que toco, recordo-me do Xiko que era tão apaixonado por essa música e esse fato me traz boas lembranças do amigo e de todos os momentos que vivemos juntos e isso vai ser para sempre", garante Daniel.

Daniel conta que Xiko era um cantador "Apaixonado por música, ele vivia cantando. Além do Baitaca, gostava também dos Monarcas e dos Serranos. Ele cantava muito bem. Recordo-me que ensaiamos a música 'A loira do carro branco' para cantar na escola. Também tenho a lembrança viva de quando ele ia na minha casa, pegava a gaita e ficava cantarolando e tirando fotos. Nossa festa era essa, além de andar a cavalo e andar pelos matos, vivíamos tocando e cantando".

"Xiko cantava bem e gostava de cantar. Tinha paixão pela música, se tivesse tido a oportunidade de ter um professor e se ainda estivesse entre nós, seria um grande cantor", afirma Daniel.

Diante de tanta paixão que o filho tinha pela música do Baitaca 'Do fundo da grota', a família decidiu colocar um trecho da letra no jazigo do filho "Era a música que ele mais cantava e pra gente foi muito importante fazer essa última homenagem de colocar um trecho da música na lápide", conta Luiza.

...Meu pingo de arreio relincha na estrebaria enquanto uma saracura vai cantando empoleirada. (Trecho da música preferida)

Na memória de Mateus, essa parte da música está muito viva, porque presenciava o irmão cantando o tempo todo "Lembro-me como se fosse hoje, o Xiko atrás da casa cantando 'Enquanto uma saracura vai cantando empoleirada', não sei porque ele gostava tanto dessa parte", questiona, em lágrimas, o irmão.

"Tanto é, que hoje ainda, ao entardecer, quando canta a saracura a gente lembra dele. Nunca tinha observado que uma saracura consegue se empoleirar, sempre achei que só corria pelo chão, mas depois de entender o amor do nosso filho por essa letra não tem como não lembrar dele, principalmente ao entardecer", revela Luiza Junkes Kotelak.

Mauri lamenta não ter realizado o sonho do filho de ter uma gaita. "Era o sonho do Xiko também colocar uma bota e uma bombacha. Eu estava procurando uma gaita pra comprar para ele, mas uma pena, não deu. Não tive a possibilidade de realizar esse sonho do filho", lamenta.


Para homenagear o amigo, Gabriel tem um sonho

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Para homenagear o amigo e a família, Gabriel tem um sonho "O meu sonho, o meu desejo é um dia poder trazer o Baitaca perto de nós, na minha casa. Pois, acredito que desta forma, de alguma maneira o Xiko vai estar presente no momento em que o Baitaca tocar a música 'Do fundo da grota'. É uma maneira de trazer o Xiko perto de nós novamente", confia Gabriel.

O jovem finaliza com o pedido ao Baitaca "Se o Baitaca aceitar o nosso convite, fico muito agradecido. Em agosto faço aniversário, ficaria muito feliz se pudesse recebê-lo nessa data, prepararemos costela fogo de chão, churrasco e cerveja. Mas se não puder em agosto, em qualquer data será especial".

 Francisco Mauri Kotelak era devoto de Nossa Senhora Aparecida. Sempre carregava em sua mochila uma pequena imagem que lhe pertencia. "Em um acampamento que os jovens amigos fizeram na nossa propriedade, Xico pediu silêncio e puxou uma oração, pedindo que Nossa Senhora protegesse a todos amigos que ali estavam", revela Tarcísio Kulkamp.


Letra da música 'Do Fundo da Grota'

Baitaca

Fui criado na campanha

Em rancho de barro e capim

Por isso é que eu canto assim

Pra relembrar meu passado

Eu me criei arremendado

Dormindo pelos galpão

Perto de um fogo de chão

Com os cabelo enfumaçado

Quando rompe a estrela d'alva

Aquento a chaleira já quase no clariá o dia

Meu pingo de arreio relincha na estrebaria

Enquanto uma saracura

Vai cantando empoleirada

Escuto o grito do sorro

E lá do piquete relincha o potro tordilho

Na boca da noite me aparece um zorrilho

Vem mijar perto de casa

Pra inticá com a cachorrada

Numa cama de pelego

Me acordo de madrugada

Escuto uma mão pelada

Acoando no banhadal

Eu me criei xucro e bagual

Honrando o sistema antigo

Comendo feijão mexido

Com pouca graxa e sem sal

Quando rompe a estrela d'alva

Aquento a chaleira já quase no clariá?


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